Mas, afinal, o que é Literatura Fantástica?
- Ricardo Costac
- 29 de nov. de 2021
- 6 min de leitura
Atualizado: 6 de jan. de 2023

Dentre outros gêneros literários, existe um que se dedica ao mundo mágico que desafia a realidade. Este é conhecido geralmente como Literatura Fantástica e compreende a Fantasia, a Ficção Científica e o Terror.
Tentarei dar uma breve definição de cada um e, a partir daí, destacar algumas características e minúcias históricas, sociais e culturais.
A classificação que se pretende dar ao gênero é clara e bem demarcada em obras de referência, e também é possível identificar tais aspectos em obras que não se enquadram neste segmento, pois tais obras poderiam muito bem fazer parte do Universo Fantástico pouco considerado pela crítica.
E será mesmo que a Literatura Fantástica, também conhecida como Ficção Especulativa, é algo menor ou existe um preconceito não declarado a seu respeito?
Então começarei este artigo povoado de seres sobrenaturais, naves alienígenas e criaturas assustadoras.
Em outras palavras.
A literatura fantástica é um gênero literário que se baseia em elementos sobrenaturais ou fantásticos em sua narrativa. Ela pode incluir elementos como magia, monstros, criaturas sobrenaturais, mundos paralelos e dimensões alternativas. A literatura fantástica geralmente se concentra em temas de imaginação e aventura e pode ser utilizada para explorar questões profundas e complexas de maneira vivida ou metafórica. Alguns exemplos de obras de literatura fantástica incluem "O Senhor dos Anéis" de JRR Tolkien, "Harry Potter" de JK Rowling e "O Nome do Vento" de Patrick Rothfuss.
Por definição temos:
A Fantasia
Invariavelmente este gênero está ligado a mundos mágicos repletos de criaturas fantásticas, como dragões, fadas e magos poderosos. A magia normalmente está presente em suas estórias espetaculares em que objetos podem abrigar poderes e mistérios que deverão ou não ser desvendados ao longo da trama.
Na Fantasia, alguns heróis são guerreiros de honra inatingível, destemidos e dispostos a todo sacrifício para salvar o mundo em que vivem. As espadas ganham personalidade, capazes de definir uma batalha e até serem o ponto culminante e decisivo ao final da trama.
Castelos e palácios são as imponentes habitações de reis e feiticeiros. Suas altas torres, amplos salões suntuosos e masmorras escuras e úmidas servem de cenário para os acontecimentos mais inverossímeis.
As batalhas são épicas e nelas encontramos toda sorte de contendores, sejam eles humanos ou assustadores seres fabulosos.
A Fantasia é muito mais antiga e se perde no tempo. Se levarmos em consideração que grandes clássicos, como a Ilíada e a Odisseia de Homero, reúnem todos os elementos necessários para categorizá-las como tal, então esta classe talvez não seja uma subcategoria como alguns supõem.
A Ficção Científica
Esta linha literária quase sempre esteve ligada às tentativas de se adivinhar como será ou seria a vida e as tecnologias em um futuro próximo e por outras vezes muito distante. Máquinas complexas controladas por pessoas de inteligência superior surgiram das mentes sonhadoras de escritores que se tornaram sinônimos da ficção científica como Jules Verne e H. G. Wells, para citar apenas dois.
Principalmente a partir do século XIX, com o avanço da ciência e a descoberta de terras longínquas encobertas por geleiras eternas, montanhas altíssimas e mares de profundezas abissais, a imaginação foi contaminada pelo desejo de desbravar os recônditos da Terra e ir muito mais longe, além das estrelas, mesmo que os argumentos usados possam trazer condições inverossímeis de acordo com as rígidas regras científicas, como a viagem para o tempo passado que contradiz todas as leis da física aceitas até o momento. O que vale é sonhar.
Jules Verne usou e abusou da especulação científica para criar. E criou bem. Os personagens de suas aventuras deram a volta ao mundo, flutuaram em balões, viajaram pelo espaço, mergulharam fundo nos oceanos, e ainda mais fundo até o centro da Terra. Verne é o exemplo clássico de como é possível criar grandes obras explorando as possibilidades além da realidade convencional. O avanços tecnológicos científicos atuais não foram capazes de desmerecer o feito literário que o francês, nascido no século XIX em Nantes na França, construiu ao longo dos seus setenta e sete anos de vida.
Entretanto, diferente da Fantasia e do Terror, a Ficção Científica já demonstrou que pode se fazer real. As viagens espaciais hoje são uma realidade, da mesma maneira são os autômatos construídos de metal, mas com feições e gestos humanos capazes de efetivar tarefas de precisão e sutileza impossíveis ao homo sapiens.
A Ciência Clássica e a Ficção Científica são irmãs, as belas filhas da imaginação irrequieta de nossa espécie.
O Terror
Da medicina vieram os monstros feitos com pedaços de cadáveres e médicos que se metamorfoseiam em bestas-feras (me refiro aos clássicos Frankenstein de Mary Shelley e O Médico e o Monstro de Robert Louis Stevenson). Se bem que estes também se encaixem nos temas da Ficção Científica.
O sobrenatural é a marca registrada do Terror. Podendo ser personificado em assombrações que habitam lugares tenebrosos, os contos podem conter as figuras grotescas de demônios e outros seres representantes de todo o mal que o inferno possa produzir. Os elementos primordiais deste seguimento literário são o susto e o medo ao extremo. Quando o leitor fecha o livro e se nega a dormir de luz apagada, é um ótimo sinalizador de que aquela obra atingiu seu objetivo. O receio de abrir os olhos durante a madrugada e enxergar algo aterrador é a sugestão eficaz que foi inserida na mente do leitor que, se tiver uma boa reserva de coragem, abrirá mais uma vez o objeto de seu pavor e, de olhos arregalados e a respiração contida, retomará a sua leitura de onde parou para mais uma vez morrer de medo e tratar de manter a luz da cabeceira acesa.
O Terror na literatura existe exatamente para reavivar o pavor nas pessoas. E para muitos, este sentimento se torna praticamente um vício que se alimenta da necessidade de outras estórias com mais elementos que provoquem tremedeiras, cabelos eriçados e noites sem dormir.
Como definir se uma obra é ou não é Literatura Fantástica?
Existe uma regra convincente para qualificá-la?
Para tentar obter tais respostas, irei recorrer a um dos maiores clássicos da América Latina, e que é respeitado no mundo todo. Seu título é “Cem Anos de Solidão” de Gabriel Garcia Márquez.
Sem querer revelar o conteúdo do livro e, assim, evitar estragar as surpresas e o prazer que “Cem Anos de Solidão” guarda dentro de suas páginas, é necessário conhecer um pouco do que se trata a obra e quais elementos são usados para considerá-la uma crítica social e ao mesmo tempo uma envolvente aventura sobrenatural.
A fictícia vila de Macondo, na Colômbia, conta a saga da família Buendia e sua jornada solitária por décadas de conflitos humanos, questões políticas e guerra.
O mundo mágico de Macondo se faz presente o tempo todo, tornando-se impossível negar a esse maravilhoso livro a classificação de Literatura Fantástica. Mas nem todos gostam de admitir tal atributo. Talvez por um tolo preconceito.
A “Jangada de Pedra” é uma brilhante obra do reconhecido escritor José Saramago. A estória insólita e apocalíptica se passa quando a Península Ibérica, sem uma razão aparente, se separa do resto do continente europeu e fica à deriva pelo oceano. Geologicamente isso seria impossível, mas não na mente criativa de Saramago. Durante a incrível jornada desse imenso pedaço de território que abrange Portugal e Espanha, os personagens vivem situações estranhas enquanto a Península navega como se fosse um gigantesco barco enfrentando as ondas oceânicas.
José Saramago, então, aproveita de sua habilidade literária para levantar uma crítica sobre o descaso que as demais nações europeias fazem de sua terra natal, lançando mão de simbolismos surreais e inegavelmente fantásticos para “espetar” os leitores. Vale muito a pena ler.
De uma reunião com amigos à beira de um lago em Genebra, na Suíça, e tendo o poeta Lord Byron como anfitrião, em um ano particularmente frio e chuvoso por causa da catastrófica erupção do vulcão Tambora na Indonésia, Mary encontrou tempo suficiente para escrever o que quisesse. Essa combinação de eventos fez nascer um clássico do Terror que comemorou exatamente dois séculos em 2016.
Tudo indica que a imaginação da autora foi fortemente estimulada quando ela tomou conhecimento de que corpos mortos se contraíam em espasmos ao receberem impulsos elétricos.
O mundo era “sacudido” na época pelo massivo avanço científico: a anestesia, a identificação do átomo, o eletromagnetismo, o avanço da Paleontologia com o primeiro fóssil de dinossauro, o efeito Doppler, a bombástica Teoria da Evolução, dentre outros de grande importância.
Um monstro construído com partes de cadáveres é descrito no icônico Frankenstein, o Prometeu Moderno, da muito jovem autora Mary Shelley, então com 19 anos. A modernidade tecnológica da época se mescla com o cenário sombrio de florestas e castelos afastados, pessoas deprimidas e o pavor rondando as mentes de personagens tomados pela insanidade. Essa nova forma de criar estórias recebe o nome de Literatura Gótica. E nela, Frankenstein merece um lugar especial.
Frankenstein é quase unanimidade no que se refere a ele ser uma Literatura de verdade.
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